segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Quantos micos?

Há muito tempo vieram ao nosso bar quatro adolescentes paulistas á procura de “pelo menos
dois miquinhos”.
Enquanto eu servia as bebidas encomendadas, eles se mostravam cada vez mais excitados.
_ Se a gente consegue encontrar, eu quero também; disse a moça de cabelos ruivos.
Já eram então três os micos que eles pretendiam levar.
Surpresa com tamanha inconsciência ecológica e essa euforia infantil de querer levar os miquinhos para São Paulo, eu questionei:
_Vocês querem dizer que nem conhecem a Ilha e vieram para comprar ou pegar miquinhos?
_ A gente chegou agora e deu de cara com esse adesivo com um mico! – dizia eufórico o moço de óculos escuros apontando para a logomarca na porta do jipe estacionado em frente ao bar, como se aquilo fosse uma “coincidência espiritual”.
_ É um mico não é? -  reforçou o mais gordinho, o único que não queria mico nenhum.
_ Esse, eu respondi, é um Callitrix Penicilatus. Um mico. Vive em liberdade nessa ilha ao lado de outros animais como as iguanas e os sarigueis – sem querer ofender o rapaz – e vocês não podem levá-los daqui!
_Ahhh! Mas a senhora tem miquinhos? A senhora tem? – me implorava a mais lindinha.
_ Ter? Eu não tenho nada! Muitos deles vêm até as mangueiras e goiabeiras do jardim. São muito lindos. As árvores são sempre visitadas por famílias inteiras de Callitrix.
_ Pelo amor de Deus, dona, deixa a gente então pelo menos ver! Eu posso tomar conta deles. Lá em casa eu até tenho mais árvores do que a senhora tem aqui – me pedia de joelhos o mais agitado.
_ De jeito nenhum, jovens! Daqui pra São Paulo o bichinho morre de medo, de fome e de tristeza!
_ Senhora, eu pago! – pensando dizer a palavra mágica me atirou essa o agitado.
De tão surpresa eu fiquei de boca aberta, mas ainda fui gentil com eles e disse:
_O máximo que eu posso fazer é deixar vocês irem ver se tem mico nas árvores do meu quintal. Faço isso para dar uma chance a vocês. Quem sabe vendo como os miquinhos são felizes nessas árvores vocês desistem dessa idéia de tirar os bichinhos da mãe natureza. Seria realmente uma chance, só que tenho quase certeza de que a essa hora não vai ter miquinho certo dando sopa no sol.  Vamos?
Atravessamos a cozinha branca e limpa de nosso bar e os adolescentes de São Paulo se encontraram em meio a uma paisagem abundante de frutas e folhas. Eles observaram um instante em silêncio... Em vão: nenhum miquinho apareceu.
Desapontados, os quatro me fizeram um monte de perguntas ás quais fiz questão de não responder: “como a gente pega os micos?”, ”quem vende mico aqui na Ilha?”, “o quê que eles comem?”, “até que tamanho eles crescem?”...
Desapontada com o fato de que a ilha esteja assim tão vulnerável, eu ainda ousei propor a eles de irem dar uma volta de bicicleta observando com atenção a paisagem e que certamente iam poder admirar os miquinhos nos tetos dos casarões coloniais da Praça do Campo Formoso.
Mas eles me disseram adeus me garantindo que não voltariam pra São Paulo sem “pelo menos dois miquinhos"./Marilia de Laroche

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